Nessa tarde de sábado corria no calçadão da praia (na verdade tentava, esbaforida, quase em óbito, com as batidas do coração no estilo rock´n´roll, heavy metal). Foi quando vi uma cena "meiga" que me fez parar e olhar para trás. Por mim passou um homem caminhando a passos duros, já meia idade, sisudo, com cara de poucos amigos. Logo atrás dele um cachorrinho poodle branco, bem tratado, com fita rosa amarrada ao pescoço. "Que belezinha", pensei, já com vontade de acarinhar o bicho. Mas não deu tempo nem de ensaiar uma tentativa, pois o bichinho viu que seu dono se distanciava (o homem sisudo que há pouco passara por mim) e em disparada correu atrás de seu senhor. Sim, aquele era um amigo fiel. O homem nem se importava de olhar para trás para ver se o cão ainda o acompanhava. Continuava seguindo envolto em seus longínquos pensamentos, andando rápido, atrás de não sei o quê. Pensei: será que ele não tem medo de perder o bicho de estimação? E se o cachorro for atropelado? E se for sequestrado? E se o bichinho se perder estrada afora? E se... e se...? Foi aí que me dei conta de um fato: o homem tinha CERTEZA de que o seu cão estaria sempre ali, o seguindo. A dúvida não lhe passava pela mente. Certamente já estava acostumado a sempre ter o bichinho correndo atrás dele, sem vacilar. Podia acontecer o que fosse, o animalzinho estaria lá, tão certo como o próximo passo... Bonito isso? Não. Achei estranho. Então fiz uma analogia: tem muito casal por aí com uma relação igualzinha a essa que acabei de descrever. Aconteça o que for, o/a fulano/a sabe que o outro estará sempre ali, correndo atrás, com o rabinho abanando em subserviência. Já vi muito disso, e confesso que sempre me incomoda esse tipo de relação egoísta. Pode rolar o que for: tapa, traição, ignorâncias, palavrões... o outro apaixonado estará sempre pronto a correr atrás de seu senhor. Se não há força para romper com essa relação doentia, pelo menos dê um susto... finge que some... sei lá... deixa o dono pensar que perdeu... Se o cachorrinho falasse a minha língua (ou eu a dele) lhe daria um conselho: esconda-se atrás de uma árvore... deixe o seu dono desesperado pensando que te perdeu... Queria tanto ver a cara do homem olhando para trás, assustado, procurando seu cão fiel... Não deu tempo de divagar mais. Íamos em direções opostas. Os dois se foram, homem e cão... Para onde? Para quem?...
Liliane Balonecker

Somente muita sensibilidade e talento podem produzir um texto desse tipo. Fantástico! Parabéns, Lili.
ResponderExcluirVocê sempre dizendo alguma coisa que de vez em quando eu penso... Gostei muito!
ResponderExcluirObrigada, Beth e Lauren... Tão generosas... ;)
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